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Tibulo que me perdoe,
Mas, toda sua arte…
Ultrapassada, se mostra;
Quando Delia Gliceria e Nemesis…
Deixaram-se cair dos céus
Como sementes de amêndoa.
Ambas, imortalizadas pelo poeta,
E manifestadas pela poesia.

Seria assim que diria Ovídio,
Mal apreciador da arte…
E que, em seu túmulo,
Escreveu “os Amores” em comemoração,
Não ao seu sepulcro,
Todavia, à ausência de concorrência.
Mal apreciador, duas vezes;
Pois Roma se calou diante de sua morte!!!

Corpus, Corpus, Corpus…
A Roma de Augusto, nunca mais fora à mesma.
Horácio e Virgílio morreram contigo…
Nem mesmo o cinismo de Propércio resistiu…
À mudança causada por sua passagem…
Do Jardim do Éden ao, então, possível infinito.
E, ora, que decerto não provaste da Arvore da Vida,
Embora se envenenasse pelo fruto do pecado.
Pois, Maldita é a alma que não viveu os prazeres da carne.

Tibullianum, Tibulianos, Tibulos…
Enquanto Ovídio falava da “Ars Amatoria”,
Apresentando a receita do amar;
Tibulo, dava vida ao deus Príapo,
Que vivia o amor plenamente;
Exaltando seus contos pelas bocarras dos poetas…
Ou seria profecia em oratória e escrita?
Não importa; pois para o Amor ou Eros,
São improváveis os receituários
E os mesmos caminhos… Até os proibidos.

Ultrapassadas estão a Ars Amatoria de Ovídio,
O deus trovador e fecundo de Tibulo,
Como todos os conceitos em versos de Vigílio;
Pois ambos estavam à procura de si,
Percorrendo, em devaneio, o outro.
A eloqüência, na oratória, atrai a imaginação na escrita,
E assim se leva o magistrado na elaboração da sentença.
Mas que testemunho dará o poeta,
Se ele só fala do amor, e tampouco da ninfa?
Talvez isso aconteça,
Porque a história é feita de estrofes e rimas.

Embebedei-me nas veredas destes poetas latinos,
Pais da ambigüidade, sedutores da palavra,
Adversos por natureza Romana,
Perfeccionistas por exigência grega,
Tão próximos e distantes da avareza bárbara.
Com o papel e a pena,
Exaltavam deuses e destruíam reinos.
Todavia, presunçosos em certezas;
Pois que poder é esse de achar possível conceituar
Aquilo que por si mesmo não tem conceito!!!

Imortalizados estão os poetas amantes,
Mas pode a escrita imortalizar aquilo que sinto?
Pode uma vida inteira exaltar a inspiração dum único segundo?
Pode um único vocábulo conceituar a linguística inteira?
Não; pois, no fim, outros vocábulos surgiriam…
E a maldição do conceito não acabaria;
Logo, creio que o “amor” é genitor de todo vocabulário.
Não há receita ou conceito para o subjetivo,
Afinal, tanto Vigílio quanto Tibulo estavam errados;
Pois só colocaram seus nomes na história,
E transformaram suas musas em vítimas de sua própria procura.

Mas que amor é esse tão petrificado e cínico?
Não é isso que procuro…
Pois, então, me satisfaria com a donzela na janela,
Sendo idolatrada em cantigas em tela.
Afinal, no classicismo era assim:
Cantigas atrás de cantigas…
Um botão de rosa para cima,
E uma declamação da amada em total agradecimento.
Nesse movimento literário havia o retorno e a participação,
E, infelizmente, as maravilhas ficavam aos ouvidos
E morriam com eles;
Talvez, essa seja a sina do poeta:
– Fazer monólogos e viver em ilusão.

Decerto, os retalhos desses versos
Não emanam o glamour certeiro;
Pois tampouco te conheço, tampouco sei de ti.
A única certeza que tenho,
É o relâmpago que me ataca à noite,
E que me faz escrever sem parar…
Os rabiscos dessa tempestade de letras,
A qual, ao início do dia, acalma;
Deixando meu corpo descansar.

Sobre a norma culta, já lhe peço desculpas;
Pois dela quase nada sei.
Infantilmente, deslizo sobre o papel, quebrando o jargão
E as leis, que são ditas públicas;
Mas restrito é o público que delas conhece.
E assim vou atropelando os pontos,
As vírgulas e as esquinas;
Pois não me preocupo com o som e com a forma,
Como faria o poeta parnasiano no lugar do leigo.

Não lhe escrevo no intuito puro literário;
Pois só o faço por dívida contigo.
Se por acaso, no futuro, outros se tornarem testemunhas
Daquilo que vo-la escrevo,
Saibam, desde já, que não foi por minha vontade,
Mas por acidente do destino;
Pois não faço literatura…
Só lhe escrevo aquilo que penso e sinto.

Se me perguntarem se te conheci ,
Eu direi que sim…
Depositarei minha imaginação num jantar à luz de velas,
Acompanhado pela sinfonia do mar.
Não testemunharei mais nada além de minha abstração.
Adicionaria só mais um detalhe:
– Que o seu sobrenome é fantasia e o meu, alucinação;
Pois estou bêbado de poesia e tomado por ti…
E que caiam as estrelas do céu…
Que a noite se torne dia,
Caso alguém ache que seja tudo mentira…
E que na dúvida, o papel seja minha testemunha;
Afinal, sou inocente até que a vida ou que a lua…
Provem-me o contrário.

Como descrever um homem…
Além da fumaça e do cheiro do tabaco?

Como descrevê-lo…
Além de suas roupas e de seu cachimbo?

Como descreve-lo…
Se suas ideias não podem ser vistas?

Bem… a inteligência humana é prática;
Permitindo seu tutor julgar os fatos e os objetos;
Formulando algo conhecido como pré-conceito.

Mas, como julgar alguém…
Além da loção pós-barba e de seus trajes?

Torna-se dificílimo o julgamento;
Pois não consigo me descrever…
Não consigo me conceituar em vocábulos.

Sei que sou orgânico,
Embora não faça parte do organismo.

Sei que estou muito além daquilo…
Que vejo refletido no espelho.

Afinal, sou Homem…
Não sou matéria.

Não tenho como me medir…
Ou aos meus semelhantes.

Sou simplesmente uma imagem cheia de ideias
Que vai explodir…
E revolucionar a consciência do mundo.

Vejo somente…
Muita fé…
Muita dúvida…
E muita procura.

Se não houvesse a mãe,
Não haveria o pai e nem o filho.
Se não houvesse o lar,
Não haveria a família.
Se não houvesse a família,
Não haveria a ordem.
Se não houvesse a ordem,
A sociedade seria uma catástrofe.

Se não houvesse o arroz,
Não haveria o feijão.
Se não houvesse a religião,
Não haveria a ciência.
Se não houvesse a competição,
Não haveria a qualidade de vida.
Se não houvesse a comparação,
Não existiriam os adjetivos.

Se não houvesse a escrita,
Não existiriam os livros.
Se não houvesse a moda,
Não haveria o moderno.
Se não houvesse o moderno,
Não haveria o contemporâneo.
Se não houvesse a arte,
Não haveria a criação.

Se não houvesse a estória,
Não haveria o conto.
Se não houvesse a realidade,
Não haveria a crônica.
Se não houvesse a verdade,
Não haveria a mentira.
Se não houvesse o romance,
Só existiriam os documentários.

Se não houvesse a cor,
Só haveria contraste.
Se não houvesse a forma,
Nada seria possível.
Se não houvesse o sonho,
Só haveria o sono.
Se não houvesse o cansaço,
Somente trabalharíamos!!!

Se não houvesse o rico,
Não haveria o pobre.
Se não houvesse o capital,
Não haveria o trabalho.
Se não houvesse o planejamento,
Não haveria a produção.
Se não houvesse o cobre,
Talvez não existisse o zinco.

Se não houvesse o rei,
Não haveria a revolução.
Se não houvesse a ideia,
Não haveria o ato.
Se não houvesse o ato,
Não haveria a potência.
Se não houvesse a atitude,
Não haveria a reação.

Se não houvesse o usuário,
Não haveria o tráfico.
Se não houvesse a propina,
Não haveria o corrupto.
Se não houvesse a política,
Não haveria o Estado.
Se não houvesse o Estado,
A maldade não teria sentido.

Se não houvesse o fogo,
Não haveria o calor…
Se não houvesse a dor,
Não haveria a cura…
Se não houvesse a religião,
Não haveria razão.
Se não houvesse Deus,
Tudo estaria perdido.

Se não houvesse juízo,
Não haveria o pecado.
Se não houvesse o pecador,
Não haveria a culpa.
Se não houvesse o culpado,
Não haveria sentença.
Se não houvesse a morte,
Não haveria a vida.

Se não houvesse a miséria de espírito,
Não haveria a pobreza material.
Se não houvesse a fome,
Não haveria a ganância.
Se houvesse o conflito,
Não haveria a inveja e a cobiça.
Se não houvesse o desejo,
Não existiriam a guerra e a ignorância.

Se não houvesse o abuso,
Não haveria a intolerância.
Se não houvesse a maldade,
Não haveria herói.
Se não houvesse motivo,
Não haveria o crime.
Se não houvesse o desigual,
Não haveria o normal.

É assim que nos distinguimos de todos os bichos;
Tornando-nos escravos da diferença;
Constituindo leis para que sejam quebradas;
Saciando-nos o prazer…
Através da desgraça alheia;
Vivendo em plenitude a diversidade;
Usando como referência o singular…
Sendo etnocêntricos na mesma sociedade.

Se não houvesse o senhor,
Não haveria o escravo.
Se não houvesse o ócio,
Não haveria o cio.
Se não houvesse você,
O Eu não existiria.
Se não houvesse o cheio,
Não haveria estômago vazio.

Se não houvesse tudo isso,
Não haveria a vergonha.
Se não houvesse a vergonha,
Simplesmente seria um bicho…
Devorador de outros animais…
Seria mais um…
No ciclo vicioso da evolução!!!

Não fizemos nada…
Mas nossas almas se encontram…
Em total constrangimento.
Olhávamos de lado,
Aguardando e aproveitando…
A pureza do vão momento.

Todavia, não fizemos nada…
Nada daquilo que pudéssemos nos envergonhar…
Nada daquilo que pudéssemos nos constranger…
Recebemos as chaves do cárcere,
A permissão de transitar…
O direito natural de ir e vir.

Logo, o presídio não existe;
Pois temos suas chaves…
Conhecemos seus cômodos e suas portas.
A casa deixou de ser uma prisão…
Tornando-se o centro de nossas vidas,
O útero materno de nosso lar.

Só devemos nos envergonhar daquilo que é errado…
Só devemos nos arrepender daquilo que foi feito.
Então, vamos retirar as mordaças…
E o peso de nossos grilhões…
Ou mantê-los em nossas almas
Como tributo e respeito à nossa afetividade.

Afinal…
Prendo-me a ti por amor.
Prendo-me a ti por vontade.
Prendo-me a ti por orgulho.
Prendo-me a ti por respeito.
Devo-me concluir então (…)
Que não estou encarcerado.
Mas, se aos olhos do mundo…
Não existe a coragem,
Prendo-me a ti, assim,
Por grilhões de afetividade.

Poético é viajar no calor da caneta,
Deslizando-a sobre o papel…
Alimentar com o tom da escrita
Cada polímero da folha virgem…
Descrever o mundo,
Ou descrever-me como vejo.

Mas só isso não basta…
Para se realizar um ato poético.
É necessário querer muito escrever…
Escrever com afinco…
Escrever com agrado…
Escrever com orgulho…
Escrever com o espírito.

Não se pode temer o futuro.
Não se pode temer o presente.
Só se deve temer o ato de não escrever…
Àquilo que seu coração mandar.
É assim que se inicia um rito…
O rito do amor poético!!!

Mas isso é só o início…
O princípio fundamental dum processo intrínseco,
No qual a alma deve participar na plenitude da carne;
Pois somente os vivos sabem a dor da ausência…
Somente os sórdidos desejam a vida…
Somente os loucos chegam,
Sem vontade alguma de voltar ao limbo.

Deve-se escrever com a força da vaidade…
Com a tristeza da perda…
Com a incerteza do futuro…
Com o desejo único do amanhã.
Escrever com lágrimas;
Pois o poeta só cria um estilo,
Quando sua lágrima adoça ou amarga à tinta;
Manchando eternamente a celulose.

Talvez, seja nesse momento de vazio
Que o artista sai de cima do muro…
E se inventa diante da falta de criatividade do mundo;
Pois a escrita é assim:
– Determina o escritor,
Na busca da definição íntima de seu caráter.

Todavia, ser poeta…
É fazer de sua vida comum, uma grande cruzada.
É conhecer a constituição e aboli-la…
É ser religioso em mente…
E pecador em corpo.
É isso!!! Pois para ser poeta,
É necessário cometer os sete pecados capitais…
Lamber o beiço e querer mais…
Pecar!!! Pecar!!! Pecar!!!
Mas não há pecado onde há amor…
Então é certo afirmar:
Amar!!! Amar!!! Amar!!!

Entretanto, o poeta deve se lembrar…
Que quanto maior for a viagem,
Maior será o vazio amargo no peito.
É assim que se paga o tamanho da graça…
Desejar o mundo para preencher a solidão…
E criam-se musas, seres celestiais inatingíveis…
Alimentando o fervor da loucura.

Então, sem se perceber,
Aparece diante dos olhos…
Uma moura-encantada…
Com seus cabelos negros lisos,
O semblante avermelhado, como sua túnica,
Queimada de sol…
Em suas mãos, se encontra o pente de ouro,
Que engana, que atrai o artista,
Como uma abelha à procura do néctar…
É inevitável… é uma reação natural.
O poeta vai deseja-la,
Enquanto que ela o possuirá.

Cuidado, escritor iniciante…
Pois todos estão fadados ao fracasso.
Todos desejam o matrimônio…
Uns cedo. Outros tarde.
A musa inspiradora surgirá donde menos se espera.
Ela preencherá o vazio no peito…
E dará sentido restrito ao infinito.

Isso acontecerá,
Porque já estava escrito…
Vá… Não tenha medo;
Pois tudo é válido para o poeta.
Viva a graça do amor poético.
Sinta a diferença do estar para o ser.
Seja o guardião de sua inspiração…
Só não se esqueça do dever para com a escrita.
Não aposente, jamais, a pena dentro de sua escrivaninha.
Divida sua arte com todos…
Afinal, se não for assim,
O convívio social será um desastre.

Precisa-se de um amor…
Nada melhor que um amor
Para preencher o vazio de outro.
E que o recente seja mais forte
Do que aqueles que não foram.

De amores em amores
Vou rendendo minha colcha…
Minha colcha de retalhos.

Uma lembrança daqui…
Outra lembrança de lá…
E assim vai crescendo o desespero.

Precisa-se de linha.
Mas a linha que tenho é pouca…
Menor do que preciso.

De amores em amores
Vou rendendo minha colcha…
Minha colcha de retalhos.

Não sei se sou fraco no amor,
Ou se minha linha é imprecisa.
Decerto necessito terminar minha obra-prima.

Todavia, acho que tecerei o fio do universo
E cobrirei, com minha colcha, o mundo;
Pois essa é a matéria-prima de meu agasalho…
A total exigência nos detalhes.

E não há nada melhor que…
Um amor após outro amor;
Pois a linha estica,
Enquanto os retalhos aparecem.

Então te pergunto:
Desejas ser o ponto final de minha colcha?
Ou serás um detalhe guardado no tear da memória?
Bem… Não importas,
Desde que me ajudes a cobrir o mundo.

Precisa-se das mãos
Precisa-se das pernas
Precisa-se do corpo
Precisa-se da alma
Precisa-se do espírito.
Precisa-se da fala…
Precisa-se da escrita.

Precisa-se de dinheiro
Precisa-se de trabalho
Precisa-se de tempo
Precisa-se de respeito
Precisa-se de coragem…
E também de medo.

Precisa-se de arte
Precisa-se de vício
Precisa-se de diálogo
Precisa-se de bondade
Precisa-se de ritmo
E de grandes viagens.
Precisa-se de amigo

Precisa-se da fome
Precisa-se do frio
Precisa-se sentir…
Sentir o mundo com vontade!!!
Precisa-se ganhar
Precisa-se perder
Precisa-se saber dividir.

Precisa-se de fé
Precisa-se de Deus
Precisa-se do mundo…
E do mundo contigo.
Precisa-se saber
Precisa-se pensar
Precisa-se ser.

Precisa-se dar
Precisa-se pedir
Precisa-se dançar
Precisa-se dormir
Precisa-se acordar
Precisa-se seguir
Precisa-se acreditar

Precisa-se chorar
Precisa-se sorrir
Precisa-se nascer
Precisa-se cuidar
Precisa-se sumir
Precisa-se morrer
Precisa-se ressurgir

Precisa-se plantar
Precisa-se colher
Precisa-se cantar
Precisa-se ouvir
Precisa-se blefar
Precisa-se amar
Precisa-se unir.

Precisa-se comunicar
Precisa-se interagir
Precisa-se ensinar
Precisa-se aprender…
Pois, no fim, descobriremos que…
Precisa-se mudar
Para que as coisas fiquem as mesmas.

Durante dias, semanas…
Fiquei aguardando teu telefonema,
Como o pescador da madrugada
Que depende do farol
Para retornar são e salvo em casa.

Contei as estrelas e os carneiros
Antes de adormecer…
Cultivei o mais alto grau de paciência
No âmago da impaciência.

Fui infantil desde o início…
Pois só uma criança se atreve…
A viver em devaneio o desconhecido.

Desejei-te,
Não somente em sonho,
Mas também na mente.

Para o poeta de ofício,
Só basta um acidente
Ou um mero acaso,
Para se apaixonar…

Mas paixão acidental não tem cura;
Além da conformidade
Ou da própria morte…
Pois assim a vida não teria a menor graça.

A surpresa maior se faz,
Quando me pego escrevendo
Seu nome na toalha de papel.

Escrevo-te, te aguardo…
Na esperança de receber…
O tão esperado telefonema.

Por deus!
Não vejo motivo para tanto espanto;
Pois cai da lua…
Tropecei numa de suas crateras,
E lançado… Fui… dejeto ao espaço.

Bailei com as estrelas
Na inércia de minha trajetória.
Segurei as mãos dos anjos…
E fui vagando como moribundo
Pelo insensato infinito.

Meu espírito estava livre…
A ausência de gravidade me inspirava.
E, durante a quebra das leis físicas,
Aprendi o banjo tocar,
Encoberto pela seda das fadas.

Sem dúvida,
Muitos enamorados apontaram para mim
E exaltavam em alegria:
– É um cometa…. Uma estrela cadente!!!
Todavia, estavam todos enganados;
Afinal, era somente um pirilampo…
Cantando e enfeitando o espaço.

A cidadela se encontrava sitiada
Pelos bárbaros pagãos…
A multidão, desesperada,
Batia à porta da prefeitura…
Não pelo medo da fome ou da morte,
Mas pela possibilidade…
Do mundo deixar de ser cristão.

Os mecenas compravam os soldados
Para protegerem, não suas vidas,
Mas a arte explorada de seus artistas…
Estes, por findo, se abraçavam aos quadros
E às esculturas femininas sem cabeça.
A idolatria tomava todo o reino,
Enquanto que todos aclamavam o milagre em desejo.

De vento em pompa,
Veio voando da abóbada do teatro
O vislumbre de Vênus com suas vestes azuis.
Seu corpo encouraçado de brilho e beleza,
Encontrava-se elevado sobre o útero dos fracos,
A ostra, que, no interior, trazia consigo a pérola negra,
Que atraí a ganância dos homens,
Mas não reflete sensibilidade da luz.

Então a deusa passou pela multidão
E parou exatamente no centro do bulevar.
Num único gesto, ela estendeu a pérola, dizendo:
– Aquele que tiver a coragem de Perseu,
Que pegue sua espada e lute;
Pois o prêmio será o calor eterno da paixão;
Podendo o mesmo escolher qualquer mulher como esposa.

Viam-se os homens de olhos radiantes,
Hipnotizados pela beleza do amor personificado;
Mas essa não era uma época áurea de guerreiros valorosos
Ou de homens que falassem com deuses.
A luta já era praticada pelo medo e pela desesperança.
Assim poderia haver, sequer, um homem com alma de diamante?
– Perguntava-se a deusa já quase que decepcionada.

O vento suave rompeu a praça,
Enquanto que a deusa se virava,
Movimentando, quase que numa sinfonia,
Seus cachos dourados, que brilhavam como o sol.
Ela abaixava o braço, se preparando para partir,
Quando, do nada, lhe surgem o encanto e a ironia:
– Um fidalgo idoso e decadente; pois…
Suas vestes estavam em farrapos e encardidas.

– Perdoe-me o atraso, Mademoiselle…
Todavia, o corpo não acompanha mais
A virtude do espírito, como muito menos,
O calor alvoroçado de meu coração.
Outrossim, vo-la peço desculpas pelos trajes…
Como também pelo linguajar indigno…
Jaz mui tempo que não falo com os deuses.
– Dizia o fidalgo com o sorriso de criança.

– Que ironia de Zeus!!!
Venho até aqui para conseguir um herói,
Mas, pelo que vejo, só me enviaram um poeta.
De loucos o mundo está cheio,
Mas nem os loucos de hoje são…
Tão lunáticos como de outrora.
Por tal motivo, o esquecimento é certo para mim
E para os demais deuses do Olímpio.
– Afirmou Vênus em voz alta perante o povo.

No mesmo instante lhe retrucou o fidalgo:
– Vênus, deusa do amor, da beleza e da fertilidade…
Não chores pelo inevitável, mas mantenhas viva sua chama.
Lutarei contra os árabes e os pagãos e abro mão
Da pérola e da esposa resguardada…
Só lhe apresento um desejo:
-Quero-te um único doce beijo e depois partirei.

– Soldados abram os portões da cidade!
– Ordenou o fidalgo sem mesmices.
Quando os portões foram abertos,
Só se escutava o barulho comum da natureza;
Pois no âmago da burrice,
Não havia inimigo para lutar…
Até mesmo para a deusa,
As coisas se apresentavam sem clareza.

– Quem és tu, fidalgo?
– Perguntou a deusa desconfiada;
Pois somente um deus teria tamanho poder
De fazer aparecer e sumir uma legião inteira
Num piscar de olhos.

– Sou um dos filhos fugitivos de Cronos.
Fui amparado em segredo por Gaia.
Ando pelos reinos de Hades, do ar, da água e da terra.
Meu domínio está sobre todos, deuses e humanos.
Apareço na alegria e na tristeza,
Na saúde e na guerra.
De certa forma, Afrodite,
Sou seu amante anônimo e quase seu irmão.
Tudo que faço só tem sentido contigo,
Como o mesmo contigo em relação a mim.

– Todos os deuses cairão, como os Titãs.
Todo o Olímpio terá seu fim…
Sua conotação será um mero registro da história humana.
No futuro, os diamantes acabarão…
Assim, como a beleza, a juventude e a vida…
Nós seremos os únicos sobreviventes dessa alegoria;
Pois a humanidade começa e termina sob o afago de nossos dedos.

– Tu és a lua, eu sou o sol.
Tu és o céu, eu sou as estrelas.
Tu és o beijo, eu sou o medo.
Tu és o sonho, eu sou a fantasia.
Tu és o pó, eu sou a pedra.
Tu és o tudo, eu sou o vazio.
Tu és o sim, eu sou o não.
Tu és o sono, eu sou a espera.
Tu és o começo, eu sou o fim.
Tu és o Amor, enquanto que me chamo Solidão.

– Não fales minha querida…
Não sejas imprudente como a paixão carnal.
A humanidade precisa de ti para viver,
Enquanto que necessito somente…
De seu doce beijo para fantasiar…
E preparar os solitários para te receberem
Na plenitude do espírito;
Pois só valorizam o amor,
Aqueles que o conheceram tampouco.
– Disse o deus idoso à soberana Afrodite.
A deusa ficou parada,
Olhando para a Solidão,
Que segurou sua mão e lhe deu…
Um leve beijo nos lábios.
Logo após, o deus simplesmente…
A cortejou; dando-lhe um botão de rosa,
e montou no seu bucéfalo;
Seguindo para fora da cidade.
A deusa, simplesmente, desapareceu chorando;
Abandonando a pérola por entre a multidão;
Levando, no lugar, a flor.

* * *
Foi assim que nasceu a arte do cortejo
Através do buquê de flores…
Pelo menos, na minha humilde concepção.

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